sábado, 20 de abril de 2013

O avesso da criatividade





   Na semana passada sentei pra escrever o post do blog e nada... Tentei, comecei, forcei e nada...
   Dizem por aí que o oposto da criatividade é a cópia. Discordo! (com exclamação e tudo) O avesso da criatividade é o bloqueio. Só quem já passou por um período de incapacidade criativa sabe o quanto isso dói. Fiquei a semana toda tentando achar um assunto que me fizesse escrever alguma coisa e só me libertei quando percebi o motivo desse travamento sem sentido: eu queria escrever sobre o bloqueio.
   Acho que todas as pessoas passam por isso, mas para quem convive com a criatividade esse é o monstro mais feio, daqueles que ao invés de se esconder no armário, escode todo o resto e fica passeando pela cabeça vazia, se mostrando, zombando do autor desesperado que quase sempre tem um deadline pra cumprir. Até que ou ele sucumba e produza algo sem sabor ou encontre uma arma efetiva e mate o bicho. Mate temporariamente, porque o bloqueio tem o péssimo hábito de ressuscitar. Não no dia seguinte, não na semana seguinte, mas em algum momento, sorrateiramente e quando o artista menos esperar.
  Não existe uma fórmula para evitar o bloqueio, mas existem algumas medidas que podem enfraquecê-lo. Uma delas é a biblioteca de referência, às vezes uma passeada por lá resolve o problema, outra é o “caderno de autor”, um nome chique para aquele caderninho usado, sujinho e rabiscado que deveria sempre acompanhar os artistas (ou pelo menos os mais obsessivos com eu), mas quando o monstro tem o couro duro o jeito que encontrei é olhá-lo nos olhos e dizer quem manda. Bem mais fácil falar do que fazer... Mas funciona. Foi assim que sentei e resolvi expor meu monstro para mundo, escrevendo esse texto, e com isso ele desapareceu.
   Já sofri muitos bloqueios na minha carreira de fotógrafa, e muito raramente isso me impediu de produzir com qualidade. Muitas vezes me obrigo a começar pelo óbvio, pelo cliché e a partir daí vou me soltando e acabo quase sem perceber com um trabalho bom nas mãos. 

   As fotos a seguir são de um trabalho produzido sob a sombra do temível. O ambiente onde foi clicado é o meu estúdio, ou melhor, seria porque ainda estava sendo reformado. Eu queria fazer alguma coisa lá antes que ele fosse revestido e pintado de branco, o que acabaria com o clima de masmorra, mas não sabia exatamente o que buscava. Protelei o máximo que pude, procurando a fagulha da inspiração, mas foi quando o pedreiro me disse que na segunda começaria a passar a massa que me muni de coragem, e da minha fiel câmera, e passei o fim de semana na obra. Comecei a clicar a esmo e aos poucos o conteúdo e o contexto me atingiram como uma bigorna e o resultado final foram dezenas de imagens, entre elas essas aqui.



quinta-feira, 11 de abril de 2013

Analisando




                Recebi, um dia desses, um feedback muito interessante a respeito da imagem que usei para ilustrar um dos meus post nesse blog  (“O que você vê?” do dia 1 de abril). Um grande amigo me disse que tinha gostado do texto, mas a imagem o tinha incomodado, embora ele não soubesse exatamente por que.  Fiquei bem satisfeita com a reação dele, pois era uma foto onde a intenção era gerar inquietação. Mas porque essa imagem o perturbou?



                Pra descobrir o motivo vou analisar os principais elementos da fotografia, mas antes é importante salientar que a maneira como qualquer pessoa vê uma imagem e o que ela sente e pensa sobre ela é diretamente ligado às suas experiências pessoais, seus conhecimentos específicos, enfim ao seu repertório. Vocês vão notar que essa é uma palavra muito presente nesse blog, porque representa o conjunto das coisas que cada um de nós viu, sentiu, pensou e aprendeu pela vida.  Esse repertório pessoal e absolutamente único, é o filtro através do qual produzimos e apreciamos arte.
                Bom, analisando a fotografia vemos de cara a Kombi destruída e grafitada. Aí já começa a interpretação pessoal, uma pessoa que tenha sua história ligada às artes criativas* verá nesse veículo uma expressão artística e isso será muito importante pra ela, talvez a ponto dos outros elementos serem desconsiderados na sua análise final,  outra pessoa que não tenha a criação artística em seu repertório poderá ver esse objeto como agressivo porque, para ela, é algo deteriorado e que foi “estragado com uma pichação”. Ambos estão certos.
Um elemento que a primeira vista passa despercebido, mas que faz parte do inconsciente coletivo como representando algo ruim, é o saco de lixo azul preso na roda da Kombi. Lixo é algo que nos atinge em um de nossos instintos básicos, a sobrevivência. Somos biologicamente programados pra nos afastar de coisas que possam atentar contra nossa saúde e consequentemente nossa vida. A repetição de pichação nos pilares da grade ao fundo reforça a repulsa.
As duas placas de proibido também “gritam” ao nosso inconsciente. Para a nossa cultura proibido é sinônimo de errado e transgressão é sinônimo de marginalidade. Por isso essa foto representa, de maneira geral, algo que a sociedade não quer. As pessoas integradas à sociedade tem a tendência de não gostar da foto por esta representar uma agressão às normas vigentes, já pessoas que contestem as normais sociais podem se sentir atraídas pela imagem pelo mesmo motivo.
Agora um pouco da história dessa imagem em particular. Inicialmente essa Kombi foi incendiada na alça da ponte Cidade Jardim (marginal Pinheiros) e, alguns dias depois, apareceu toda grafitada. Considerando o local onde aconteceu, foi algo fora do normal (essa grade ao fundo é o Jockey Club de São Paulo) e isso me motivou a ir até lá e fazer alguma fotos. No local percebi que essa seleção de elementos alterava a percepção do espaço real, afinal eu estava em uma área nobre da cidade. Os objetos que compõe a foto tem referência de uma contra cultura que raramente ocorre em regiões mais abastadas e a possibilidade de criar essa realidade alternativa, naquele momento me cativou. Meses depois, em um grupo de estudos de fotografia que participava, surgiu o tema “proibido” e uma das maneiras que eu achei pra estudar esse tema foi me debruçar sobre meu enorme acervo e tentar entender como eu o representava inconscientemente.
Essa foi uma das fotos onde achei minha visão pessoal do que é o proibido no nosso cotidiano. Esse estudo gerou uma série sobre suicídio como trabalho final, mas essa já é outra história. :)



*Distingo artes criativas de artes interpretativas.  As primeiras são aquelas onde o artista cria a obra (desenho, pintura, escultura, algumas fotografia, etc.), as segundas são as que o artista interpreta algo que já existe (teatro, música, algumas fotografias, etc.)

terça-feira, 9 de abril de 2013

Depois do Ready Made, o Self Made?




Nesse último mês estive em alguns eventos relacionados à arte contemporânea, um deles foi o congresso Transmuseu, realizado pelo MAM-SP, que era um ciclo de encontros de artistas, museus, galeristas e outros, voltado para a relação entre os museus e as novas mídias. Nessas mesas foi discutida, entre outros assuntos, a tendência dos artistas contemporâneos de criarem com materiais perecíveis. Foi posta a dificuldade da aquisição da obra de arte, uma vez que sua conservação é, pra falar pouco, complicada (às vezes impossível). Uma das soluções apresentadas foi a compra do “know-how” da obra, ou seja, o artista vende o projeto, com todas as especificações técnicas para possibilitar a reprodução da obra e o museu recria a mesma conforme sua necessidade. Achei isso muito interessante por dois aspectos principais, primeiro a obra de arte perde a fragilidade e com isso passa a poder ser exposta em ambientes não museológicos (lugares onde as condições ambientais não são perfeitas) como ao ar livre, ou lugares sujeitos a umidade, poluição, calor, etc. A qualidade do local da exposição deixa de ser uma preocupação porque uma vez que o museu consegue reproduzir a obra, os danos causados durante o período de exposição passam a não importar mais, no máximo a obra será destruída e refeita para a próxima mostra. Depois porque a arte passa a refletir a volatilidade da sociedade atual. Em um mundo onde nada é permanente por que a arte deveria ser? E considerando que o principal interesse de um museu é a preservação da obra adquirida, acredito que mesmo permitindo a reprodução controlada, o autor não corre o risco da deturpação do seu trabalho original. A obra é perene, mas a ideia é reapresentada a cada show, de forma que enquanto houver interesse em se mostrar a obra, o conceito é permanente.
Nessa quinta-feira fui visitar a SP-Arte, no pavilhão de bienal em São Paulo, e me deparei com uma galeria especializada em vender “projetos” de arte. Uma das peças comercializadas por eles é um pacote de balões com palavras de incentivo (uns 15 balões mais ou menos)  por  R$ 50,00. Esse projeto foi criado pelo artista para decorar uma festa da cantora Lady Gaga, e agora se encontra a disposição do público. Outra peça da mesma galeria é um estêncil de uma rosácea usado para se criar um padrão regular em uma parede, no estande da galeria tinha uma parte pintada de acordo com a ideia da artista. Um modelo do resultado final. O kit era composto pelo estêncil em acetato e uma peça com o mesmo desenho recortada a laser em uma placa de acrílico transparente. Essa peça poderia ser montada junto à parede, de acordo com o gosto de quem compra o conjunto.
Aí me veio uma dúvida... Ao contrário dos museus que estão usando a reprodutibilidade como solução para o problema da conservação das obras perecíveis, as galerias comerciais oferecem a possibilidade de reprodução de uma obra concebida por um artista, mas onde não há nenhum controle sobre a fidelidade da execução da peça final em relação à ideia original. Posso comprar aquele estêncil e usar para decorar a parede da minha sala com as mesmas cores e padrões concebidos pelo artista ou para fazer uma cortina, um móvel, um quadro e o que mais me vier à cabeça. Mas aí a obra já não será a planejada pelo autor. Seu significado, suas questões, suas simbologias originais, não mais existirão. E eu me pergunto afinal quem é o autor, o artista que idealizou a obra, ou aquela pessoa que comprou o kit e se utilizou dele em sua casa?
Se o “self-made” é uma moda passageira ou uma tendência que veio pra ficar, só o tempo nos dirá, mas, se permanecer, com certeza vai nos obrigar a repensar todo o conceito da arte.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

Você não fotografa gente? Então fotografa o que???




                Essa é uma pergunta que já ouvi, e certamente voltarei a ouvir, muitas e muitas vezes. Em um mundo tão voltado para as comunicações interpessoais tecnológicas, onde as redes sociais, e a internet em geral, tem um papel tão importante no cotidiano do indivíduo, uma boa imagem é quase uma obrigação. E não só a boa imagem pessoal, mas existe uma demanda crescente de boas imagens de tudo que acontece ao redor de cada pessoa ligada nessa teia.
Quando o convívio social oferece a oportunidade de exposição de detalhes da vida cotidiana de todos, cada um se torna uma celebridade. E junto com essa onda de produções pessoais também existe a obrigação de que sua atividade comercial tenha uma imagem em evidência. tenha sua página do facebook 30 ou 3 mil visitas por dia, é absolutamente necessário que o produto que está sendo exposto nessa vitrine virtual tenha uma representação adequada e uma linguagem clara e para isso uma boa fotografia é fundamental.
A fotografia pode ser o grande propulsor do sucesso de um produto, ou ser sua âncora. Quantas vezes você não entrou em um site procurando por algo e quando viu as fotos desanimou, trocou de site e comprou em outro lugar? A fotografia de produto tem que ser uma força na representação daquilo que não está fisicamente presente. Ela tem que ser atraente, valorizar os pontos fortes, mas sem perder de vista as características do objeto fotografado e ainda tem que ter a linguagem adequada ao seu público consumidor.









Por isso, cuidado pessoal! Fazer uma boa foto comercial exige muito mais do que apenas uma câmera na mão. Não ponha em risco a imagem do seu produto porque recuperar uma imagem desgastada é mais difícil e mais caro que criar uma boa imagem logo de cara. ;)

segunda-feira, 1 de abril de 2013

O que você vê?



        
Na semana passada falei sobre a impossibilidade de ausência do ponto de vista pessoal quando se produz qualquer obra de arte, isso me levou a refletir que: se a visão pessoal do artista é inevitável, a sua linguagem é o que faz com que sua mensagem seja possível de ser decifrada. Acredito que a linguagem seja a coisa mais importante na produção de uma obra, sem ela a ponte entre a mente do artista e seu público não existiria e toda obra de arte seria vista apenas como algo decorativo. E aqui eu proponho a questão deste post, se é impossível criar sem se expressar e existem obras que, para cada um de nós, é “meramente” decorativa, onde está a falha? Ou o artista falhou na linguagem, ou nós falhamos na interpretação dessa linguagem. Temo que a segunda opção seja a mais comum.
Uma vez um psicólogo me disse que se você não entende a mensagem, não quer dizer que ela não exista, apenas que você está olhando para a coisa errada. Acho que essa colocação seja muito pertinente no que diz respeito ao entendimento de qualquer obra de arte.
Para desenvolver o olhar artístico, devemos aprender a ver. Um bom começo é conhecer algo sobre o artista, conhecer o contexto social em que ele se insere, as questões que ele costuma colocar em suas obras, o ponto de partida para a criação daquela obra específica. Outra maneira de desenvolver esse olhar é entendendo um pouco sobre simbologia, criatividade e processos criativos.
O mundo complexo em que vivemos hoje nos apresenta, a todo momento, uma cacofonia de símbolos e contextos, que absorvemos e resolvemos sem perceber. Cada vez que vamos de metro a algum lugar temos que decifrar uma enormidade de símbolos (letras, números, cores, linhas e pontos) caso não fossemos capazes de compreender toda essa simbologia, acabaríamos perdidos. Então essa coisa de decifrar símbolos não é algo que desconheçamos, afinal praticamos isso incessantemente todos os dias das nossas vidas, o caso é transpor isso para um meio mais etéreo que é a arte. Essa adaptação é possível quando nos propomos a desenvolver o nosso lado criativo e artístico. Mais uma vez a maneira de criar um olhar simbólico é a prática. A solução tanto para quem quer desenvolver a linguagem simbólica, de forma que seja possível fazer arte com boa comunicação, tanto para quem quer enxergar a simbologia contida na arte e com isso poder apreciar mais completamente as obras produzidas por outros artistas (ou ambos).  Por isso, mais uma vez, mãos a obra! Afinal arte é expressão.